Imagine um lugar onde crachás funcionam quase como convite para conversa, onde líderes do mundo todo sentam lado a lado para debater o futuro e, no intervalo do café, nasce uma ideia que pode virar projeto. Esse é o clima do Skoll World Forum, que aconteceu em abril, em Oxford. O evento reúne pessoas que trabalham sério (e em rede) para tentar resolver os grandes problemas do nosso tempo.
Foi lá que Ana Fontes, da Rede Mulher Empreendedora, se encontrou com outras líderes do projeto Dandelion — uma iniciativa criada por mulheres para apoiar outras mulheres com impacto real em suas comunidades. De encontros inspiradores a provocações inesperadas, ela voltou com a mala cheia de ideias e alguns bons questionamentos. Na entrevista a seguir, Ana conta o que viu, ouviu e vai aplicar por aqui.
Qual foi a importância de participar do Skoll World Forum representando o projeto Dandelion? Como essa experiência contribuiu para ampliar o alcance e os aprendizados?
O Skoll World Forum é totalmente preparado, em termos de conteúdo e networking, para que as pessoas se conectem. Eles têm vários momentos, mesas e espaços organizados para que os participantes possam sentar, fazer reuniões, conversas rápidas e se conectar. É um exemplo de como tudo é realmente estruturado para isso. Outro exemplo são os crachás — o tamanho é bem grande, quase como um mini “hall door”, o que permite identificar com muita clareza quem são as pessoas, de onde vêm e o que estão fazendo.
Neste ano, fui pelo projeto Dandelion, que é uma iniciativa fundada por mulheres — pela Mary Robinson, que foi a primeira mulher presidente da Irlanda, e pela Pat Mitchell, uma apresentadora muito importante nos Estados Unidos. Obviamente, há outras fundadoras no projeto Dandelion, mas o essencial é que se trata de um projeto formado por mulheres para apoiar outras mulheres e organizações que estejam fazendo a diferença ou causando impactos locais.
Foi importante estar nesse grupo porque pudemos trocar ideias. Era um grupo pequeno, e tivemos alguns eventos paralelos exclusivos para a delegação do projeto Dandelion. Trocamos ideias, informações, cada uma apresentou seus projetos e, claro, ouvimos bastante das fundadoras. Isso foi muito interessante, pois elas compartilharam um pouco da história, da jornada e do quanto o projeto está fazendo a diferença na vida das mulheres.
Então, foi extremamente importante participar do Skoll World Forum, foi extremamente importante participar como membro do projeto Dandelion, e com certeza vou aplicar muitas coisas aqui dentro da Rede e do Instituto — aprendizados e vivências que trouxe de lá.
Quais foram os principais insights ou provocações que você leva desta edição do Fórum? Houve alguma fala, encontro ou tendência que mexeu especialmente com você?
Os principais insights… Olha, foram muitos, né? Mas, pensando em um foco específico, gostei muito dos debates sobre filantropia, especialmente sob a perspectiva das fundações e organizações que hoje são, no mundo, as maiores doadoras de recursos para o terceiro setor — como a Gates Foundation, Open Society, Fundação McCartney, e também a Fundação Ford.
Foi muito interessante ouvi-los falando sobre o quanto, neste momento delicado do mundo, é ainda mais importante que as fundações e grandes filantropias estejam atentas aos movimentos globais e consigam apoiar os empreendedores sociais em suas ações, em cada país.
Isso foi muito relevante. Inclusive, uma fala de um dos CEOs dessas fundações me marcou bastante. Ele disse que é fundamental que as grandes organizações ouçam os empreendedores, que possam trocar ideias e entender quais são as grandes demandas.
Um segundo ponto que me marcou foi uma palestra específica de um filósofo PhD do Quênia, chamado Báyò Akómoláfé. Ele falou sobre liderança sob outra perspectiva: não a liderança de quem sabe tudo, de quem está à frente ou forma outros líderes, mas a liderança de quem não sabe e está junto para provocar. É um conceito de liderança mais colaborativa, mais próxima. Achei isso muito interessante, até porque ele coloca que a forma como aprendemos sobre liderança hoje é muito baseada em um modelo eurocentrado. E ele estava trazendo uma visão diferente, mais conectada com o continente africano. Achei muito bacana.
O terceiro ponto que achei muito interessante foi a fala recorrente de que não vamos mudar o jogo se não trabalharmos em conjunto. Enquanto não atuarmos como um ecossistema — ou seja, setor privado, sociedade civil por meio das organizações sociais e o próprio governo —, não conseguiremos articular ações de forma coordenada e gerar impacto real. Claro que há outras questões, mas essas três já são, por si só, bastante interessantes para levantar debates.
Em um ano especialmente desafiador, quais transformações, avanços ou retrocessos chamaram sua atenção entre as lideranças presentes no evento?
Acredito que, entre os avanços, um deles foi a autocrítica das próprias filantropias sobre a necessidade de trabalharem mais juntas, apoiarem mais os empreendedores sociais e ouvirem essas lideranças.
O segundo foi o olhar mais amplo para o ambiente de empreendedorismo social e de impacto como um ecossistema. Ou seja, como apoiar iniciativas que apoiam outras iniciativas e que atuam em conjunto?
E o terceiro ponto, como já mencionei, foi o reconhecimento de que não vamos mudar o jogo sem trabalhar em conjunto. Enquanto não atuarmos como um ecossistema — setor privado, sociedade civil e governo —, não conseguiremos articular ações com impacto relevante. Claro que há outras discussões importantes, mas acredito que essas já nos fornecem material suficiente para refletir e debater.