A terra seca, marcada pelo tempo e pela memória, ganha novas formas e significados na exposição Sertões, da artista Geovana Cléa. A mostra está em cartaz na Galeria Hugo França, em Trancoso, até o dia 20 de junho.

São 26 obras inéditas, feitas com diferentes tipos de barro coletados manualmente pela artista. Cada peça carrega em si histórias de vida, tradição e ancestralidade.

Uma jornada de volta às raízes

Após passar por São Paulo, pela Ilha do Ferro e pelo Salão do Móvel de Milão, Sertões chega ao litoral baiano com criações exclusivas para o espaço. Durante três meses, Geovana deixou sua casa na Itália para viver uma imersão profunda em sua terra natal. Assim, reconectou-se com a paisagem, os afetos e as memórias que moldaram sua trajetória.

As obras foram esculpidas com quatro tipos distintos de barro. Cada um deles carrega uma narrativa singular. O barro do sertão baiano, extraído da fazenda deixada por seu pai, foi utilizado na obra The Gift. Já o barro ancestral da Ilha do Ferro traz a força do tempo. O barro preto de Inhapi, vindo das lagoas, remete à tradição da louça artesanal. Por fim, o barro vermelho da estrada da Promissão aparece em peças como Mané Ambrósio, homenagem ao homem que acolheu Geovana em sua jornada.

Seu João Bolinha, 80x65, 4 tipos de barros naturais De Inhapi, Promissão, Ilha do Ferro, Santa Brigida - Sertão da Bahia. Foto: Maria Daiane
Seu João Bolinha, 80×65, 4 tipos de barros naturais De Inhapi, Promissão, Ilha do Ferro, Santa Brigida – Sertão da Bahia. Foto: Maria Daiane

Arte sensorial e conexão com a natureza

As esculturas se espalham por um terreno de 30 mil m², no coração da Mata Atlântica. O visitante é convidado a caminhar entre as obras, em contato direto com a natureza e com a matéria-prima que as originou. Pequenas porções dos barros utilizados estarão expostas para que o público possa ver e tocar.

Além da terra, as obras trazem cristais especiais — alguns vintage — em parceria com a Swarovski. As tintas e pós usados são naturais, desenvolvidos com a colaboração da Ibratin. Esses elementos elevam a estética das peças e reforçam a união entre o rústico e o sofisticado.

Mestre Petronio, Barro marrom da Ilha do Ferro e pó de quartzos pretos, 80x65. Foto: Maria Daiane
Mestre Petronio, Barro marrom da Ilha do Ferro e pó de quartzos pretos, 80×65. Foto: Maria Daiane

Homenagens e símbolos de resistência

Cada escultura tem um nome, uma memória. A obra João Bolinha homenageia o pai de uma amiga de infância. Já a série Flores do Sertão celebra a força feminina. Cada peça dessa série leva o nome de uma mulher sertaneja, compondo um jardim simbólico de resistência e delicadeza.

“Dentro de mim, minha arte era minha terra. Ela me trouxe de volta para perto de mim mesma, daquela menina que sonhava e viajava por meio dos seus livros”, diz Geovana.

Zé de Cesario. Barro preto de Inhapi com pó de pérolas e acrílico.Foto: Maria Daiane
Zé de Cesario. Barro preto de Inhapi com pó de pérolas e acrílico.Foto: Maria Daiane

Curadoria e poesia entre esculturas

A curadoria é assinada pela arquiteta alagoana Mariana Moura, especialista em arte contemporânea. Foi em Milão que ela conheceu Geovana e iniciou a conexão que agora se materializa nesta exposição. Mariana também propôs um elemento inédito: uma poesia da própria artista, impressa entre as obras. Assim, palavra e forma se encontram para ampliar a experiência do público.

Painho Pequeno, 80x80, Barro natural preto com cristais Swarovski. Foto: Maria Daiane
Painho Pequeno, 80×80, Barro natural preto com cristais Swarovski. Foto: Maria Daiane

Sobre a artista

Natural de Inhapi, no sertão de Alagoas, Geovana Cléa vive na Europa há quase três décadas. Sua trajetória inclui exposições em Roma, Milão, Veneza, Paris, Nova York e Dubai. Ela participou da Bienal de Veneza e do Salon National de Beaux-Arts, no Louvre. Atualmente, é a única artista brasileira com obras à venda na tradicional loja Harrods, em Londres.

Desde 2013, Geovana transforma o barro rachado — símbolo da seca e da resiliência — em linguagem artística. Em Sertões, sua arte volta às origens e reafirma a força do chão nordestino como potência criativa.

Serviço
Sertões – por Geovana Cléa
Galeria Hugo França – Trancoso
Rodovia BA-001, s/n, próximo ao trevo Trancoso/Caraíva
Visitação: até 20 de junho de 2025
Seg–sex: 10h às 17h | Sáb, dom e feriados: com agendamento prévio

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