O Brasil está envelhecendo. Segundo o IBGE, até 2030, o número de pessoas com 60 anos ou mais deve superar o de crianças e adolescentes de até 14 anos. Em 2050, os idosos representarão quase um terço da população. Diante dessa nova realidade, cresce a urgência por políticas públicas e práticas de saúde que assegurem qualidade de vida e autonomia ao longo do envelhecimento.
Para o geriatra Dr. Sergio Alves, da UBS Jardim Comercial – unidade gerida pelo CEJAM (Centro de Estudos e Pesquisas “Dr. João Amorim”) –, envelhecer bem não começa na velhice. “A preparação para um envelhecimento saudável se inicia ainda na meia-idade, com hábitos equilibrados, acompanhamento médico e um olhar ampliado sobre a saúde”, explica.
Mais que ausência de doenças, presença de funcionalidade
Longevidade com qualidade não se resume à ausência de enfermidades. Pelo contrário, o envelhecimento ativo envolve manter a funcionalidade, cultivar laços sociais e garantir o bem-estar mesmo diante de condições crônicas como diabetes e hipertensão — cada vez mais comuns nessa faixa etária. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que 80% das pessoas idosas viverão com ao menos uma condição crônica.
“Ter uma doença crônica não significa perder qualidade de vida”, ressalta o Dr. Sergio. “Com cuidados contínuos, suporte familiar e escolhas saudáveis, é possível envelhecer de forma ativa e plena.”
Entre os pilares defendidos pelo especialista estão: prática regular de atividade física, alimentação balanceada, vacinação atualizada, acompanhamento psicológico e, principalmente, a preservação da autonomia. “Precisamos mudar a lógica: em vez de focar apenas na doença, devemos promover a manutenção da saúde e da independência”, afirma.
Saúde mental: parte essencial, mas ainda negligenciada
Apesar de sua importância, a saúde mental do idoso ainda recebe pouca atenção. Transtornos como depressão e demência precisam ser identificados e tratados com sensibilidade. “Muitas vezes, o estigma atrasa o diagnóstico e o início do cuidado”, alerta o médico.
Nesse sentido, a atuação das equipes de atenção primária é fundamental. Durante consultas e visitas domiciliares, os profissionais são treinados para identificar sinais precoces e envolver as famílias no processo de cuidado. Casos de depressão geralmente envolvem acompanhamento psicológico e, se necessário, o uso de medicamentos. Já nos quadros de demência, como o Alzheimer, o diagnóstico precoce pode retardar o avanço da doença e garantir maior conforto ao paciente.
Modelo de atenção integral: o exemplo do CEJAM
Para fortalecer a rede de atenção ao idoso, o CEJAM vem ampliando suas ações de cuidado humanizado em unidades sob sua gestão. A “Linha de Cuidados da Saúde do Idoso” integra diferentes abordagens, promovendo não apenas o controle de doenças, mas também o fortalecimento de vínculos, a prevenção de quedas e o estímulo à participação social.
A estratégia inclui avaliações clínicas amplas, como a Avaliação Multidimensional da Pessoa Idosa (AMPI), imunização, grupos terapêuticos, rodas de conversa e visitas domiciliares. Além disso, há foco na saúde bucal, na atividade física e no apoio emocional.
Na UBS Jardim Maracá, por exemplo, 4.815 idosos estão cadastrados, representando 19% da população atendida. De acordo com a gerente da unidade, Márcia Paschoaleto, o modelo de cuidado é centrado na pessoa. “Trabalhamos com foco na autonomia e na prevenção. A integração entre diferentes profissionais e serviços da rede é essencial para garantir um cuidado contínuo e de qualidade”, destaca.
Os resultados são positivos: maior adesão aos tratamentos, controle mais eficaz de doenças, detecção precoce de vulnerabilidades e preservação da capacidade funcional.
O papel das políticas públicas
Apesar dos avanços, ainda há desafios a enfrentar. Para o Dr. Sergio, o Brasil evoluiu nas últimas décadas, mas precisa fortalecer a estrutura das políticas voltadas à terceira idade. A Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa (PNSPI) é um marco nesse processo, ao propor um olhar ampliado para a saúde e a funcionalidade do idoso.
“Estamos cultivando essa árvore. Ela já tem tronco e raízes, mas ainda precisa de cuidados para florescer por completo”, compara o médico. A proposta da política é clara: estimular o envelhecimento ativo, garantir integração entre os serviços de saúde, promover a participação social e ampliar os recursos para o cuidado humanizado.